Gota Preta abre chamada para artistas.
Iniciativa idealizada por Ciça Pereira e Tainá Ramos busca visibilizar produções afro-diaspóricas e romper com as lógicas excludentes do mercado da arte
Criado em 2019 pelas produtoras culturais Ciça Pereira e Tainá Ramos, o Gota Preta é uma iniciativa da Zeferina Produções que atua como guarda-chuva de aceleração artística para criadores pretos, periféricos, indígenas e LGBTQIAP+ em todo o Brasil e no mundo. Em sua nova fase, o projeto lança uma chamada pública com o objetivo de mapear, apoiar e visibilizar artistas que constroem narrativas a partir de vivências afro-diaspóricas e dissidentes.
Mais do que promover inscrições, o Gota Preta propõe uma escuta ativa das margens, buscando romper com as lógicas tradicionais do mercado da arte e construir uma rede de circulação autônoma, ética e coletiva. O projeto se organiza em torno de pilares como formação, memória, difusão, comunicação e cuidado com artistas em situação de vulnerabilidade.
O Gota Preta é um sonho de muitos pensado e parido por mim e Tainá Ramos, acreditamos que ve-lo no mundo é permitir que nossas histórias na arte sejam compartilhadas através da visibilidade de cada artista não branco que se permite partilhar duas vivências em suas obras. A função dele nasce de fortalecer e oportunizar caminhos para que nossas artes possam realizar e nossos artistas possam sobreviver dela. Afirma Ciça Pereira, uma das idealizadoras.
A urgência da proposta se revela em dados recentes sobre desigualdades culturais no Brasil. Segundo a pesquisa Cultura nas Capitais (JLeiva Cultura & Esporte, 2025), divulgada pela Folha de S.Paulo e disponível no site oficial da pesquisa, pessoas brancas frequentam majoritariamente museus (32%), bibliotecas (28%) e teatros (29%), enquanto pessoas pretas se concentram em shows (44%) e festas populares (39%). O levantamento mostra como o acesso aos espaços de legitimação artística ainda reflete desigualdades raciais estruturais.

Essa exclusão também atinge diretamente a liberdade de expressão. O relatório “Percepções sobre a Liberdade Artística no Brasil”, publicado em 2025 pelo Nonada Jornalismo em parceria com o Observatório de Censura à Arte, revela que 69% dos artistas já censuraram a si próprios por medo de retaliação. Quase metade (44,2%) dos entrevistados relatou ter sofrido ataques — como assédio, exclusão ou violência — por causa de suas obras. Esses ataques recaem especialmente sobre artistas negros, indígenas, LGBTQIA+ e mulheres.
Neste cenário, a proposta de mapeamento do Gota Preta se apresenta como uma ferramenta de resistência e estratégia de inclusão. A intenção não é apenas encontrar artistas, mas reconfigurar os circuitos da arte para que mais vozes possam ser ouvidas
“A ideia do mapeamento surgiu na intenção de democratizar nosso trabalho, principalmente porque a nossa intenção é fomentar artistas pouco conhecidos”, explica Ciça. “Não gostaríamos de reproduzir a lógica de ‘panelas’ que o mercado das artes já conhece. Então mapear nos ajuda a expandir a atuação.”
Ao reunir produções ligadas às artes visuais e suas transversalidades, o Gota Preta propõe uma curadoria viva, comprometida com a memória, a subjetividade e a coletividade como princípios de criação e existência. A chamada está aberta e pode ser acessada pelo Instagram do projeto.
Artistas interessados em participar da chamada podem se inscrever por meio de um formulário online disponível no perfil oficial do projeto. As inscrições são gratuitas e abertas a pessoas pretas, indígenas, periféricas e LGBTQIAP+ de todas as regiões do Brasil e do mundo. Para acessar o formulário, basta entrar no Instagram @gotapreta.co ou diretamente pelo link: https://forms.gle/bh2Ztqg9Hm7iiq6E6.
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